Galinhas, como todos os animais, possuem uma linguagem única
para comunicar-se com os de sua espécie. Cada sequência de sons que elas piam,
cacarejam e cantam tem um significado social, emocional ou pessoal. E se você
passar tempo suficiente com esses amigos emplumados, você começaráa escutar as
histórias que elas estão contando, assim como aconteceu comigo.
O canto trompeteador do galo convocando suas galinhas para o
jantar.
As piadas rápidas dos pintinhos enquanto procuram por sua
mãe.
O cacarejo oscilante de uma galinha enquanto ela bota um
ovo…
De todos os sons que eu conheci durante o ano que passei
voluntariando em fazendas orgânicas, eu acredito que a canção de botar ovos das
galinhas foi o que mais me impactou. De alguma forma eu acreditava que era um
processo silencioso, que as galinhas iam sorrateiramente para o seu esconderijo
favorito e calmamente construiam seu
ninho.
Enquanto as galinhas realmente buscam a solidão à medida que
o processo de postura de ovos se inicia, elas também começam a emitir um padrão
inconfundível de cacarejos acentuado por um notavelmente alto “Cóooo!”ao final
de cada frase. Elas cantam esta canção com tanta intensidade, olhos arregalados
e agitados, até que o ovo seja finalmente empurrado para fora. É
o suficiente para fazer qualquer um se sentir agradecido por não ter nascido
uma galinha poedeira.
Embora
nossas galinhas poedeiras de hoje sejam as descendentes do Galo Banquiva
(Gallus gallus) que bota cerca de 60 pequenos ovos por ano, a
maior parte das nossas galinhas domesticadas modernas foram criadas para botar
mais de 300 ovos grandes por ano.
Se deixadas livres para se comportar de maneira “natural”, a
maior parte das galinhas vão botar o numero de ovos que desejem para uma ninhada
apropriada e então param de produzir mais ovos até que seus filhotes estejam
crescidos o suficiente para alimentarem-se sozinhos.
O período antes da eclosão de seus ovos, enquanto ela se
senta em seu ninho, esquentando e protegendo seus ovos, é chamado de “período
de choca”.
Se os ovos de uma galinha são retirados em uma frequência
regular, ela continua a botar, em uma tentativa inútil de seguir seus instintos
e formar uma ninhada apropriada. Na verdade, os instintos de aninhamento das
galinhas são tão fortes que elas continuam a tentar montar uma ninhada tendo ou
não um galo presente para fertilizar os seus ovos*.
*Acredita-se que as
galinhas não tem como saber quais de seus ovos foram fertilizados com sucesso.
Nesse ponto minha empatia por estas pequenas fêmeas
emplumadas deve estar evidente, mas infelizmente não esteve sempre tão presente.
Durante o tempo que trabalhei com elas, houve um
bocado de experiências que mudaram minha
perspectiva sobre ovos e abriram meu coração para as galinhas que os haviam
botado.
A
primeira começou fazendo uma omelete caseira de “ovos frescos de fazenda” de
ovos que uma amiga havia coletado. Eu quebrei dois ovos sem nenhum problema.
Mas no terceiro, ao invés de gemas e claras, um corpo pequeno e parcialmente
formado de pintinho escorreu para a frigideira. Meu estômago subiu por minha
garganta. De alguma forma ver o início de um corpo em um dos ovos que eu estava
prestes a ingerir pareceu muito diferente para mim do que simplesmente ingerir
um óvulo não fertilizado. De repente ovos não eram mais algo que você
simplesmente escolhe no Mercado. Ao invés disso, eu comecei a enxerga-los como
o começo de uma galinha.
A segunda
experiencia que mudou minha perspectiva foi o dia que eu me vi retirando ovos
diretamente debaixo de uma galinha chocando. Nesta manhã em particular eu
estava ajudando a podar lavanda em uma fazenda que eu estava voluntariando. Meu
anfitrião e eu estavamos cortando as lavandas quando de repente escutamos um
cacarejo agitado abaixo de nós. Conforme empurramos um dos arbustos nós encontramos
uma galinha preta grande que tinha feito um ninho. Ela estava tentando proteger
sua ninhada dos intrusos que pairavam sobre ela, mas ela não era capaz disso.
Ela havia sido trazida para a fazenda para produzir ovos, e ainda que ela
tivesse sido astuta o suficiente para construir um ninho longe do galinheiro,
seus ovos não eram considerados como propriedade dela.
Como nós
conseguimos tirar ela do ninho está um pouco nebuloso na minha memória, mas eu
acredito que a distraí enquanto meu
companheiro no crime rapidamente a apanhou. E então eu tomei os ovos de
debaixo dela.
Eu rapidamente coloquei os ovos na
geladeira para que os funcionários da fazenda levassem para casa, já que
pensamos que ela não havia chocado por tempo suficiente para que os pintinhos
se formassem.
Quando fui para fora de novo, eu
encontrei a galinha preta frenéticamente ziguezagueando para dentro e para fora
da lavanda, chamando por suas amigas galinhas, algumas das quais correram para
acudir enquanto ela continuava procurando por seus ovos desaparecidos. Eu
tentei colocar minha culpa de lado e continuar com meu dia. Mas quando
retornamos para almoçar, horas mais tarde, ela ainda estava lá se movendo
vagarosamente para dentro e para fora da plantação de lavandas e balbuciando
consigo mesma enquanto procurava em vão.
Eu falei de minha culpa para o meu
anfitrião e nós debatemos sobre se nós deveríamos devolver os seus ovos. Até
que finalmente acordamos que era tarde demais, os ovos haviam sido resfriados
por muito tempo e nós deveríamos deixar estar.
De alguma forma, cada ovo botado
drenou seu corpo de cálcio e outros nutrientes essenciais*, desnecessariamente
encurtando sua vida para alimentar os seus captores. E agora, não importa o
quanto seus pequenos olhos tristes procurem, todo o seu trabalho foi perdido.
*Algumas
galinhas (se elas não tiveram seus bicos decepados) irão comer seus próprios ovos
não fertilizados se o ovo estiver quebrado, se elas estiverem sob estresse,
para repor nutrientes perdidos pela bota de ovos (se elas estiverem com falta
de nutrientes), ou se não houver espaço suficiente no ninho.
O que é um ovo para uma galinha?
Cada galinha,
assim como com as pessoas, é diferente. Algumas são distraídas, chocando no
meio do
quintal.
Outras são agressivas e reservadas, tentando bicar os calcanhares de qualquer
um que passe por perto. E outras ainda, como a mamãe galinha da lavanda, que criam
laços com cada ovo que botam.
Não
importa a personalidade, não importa onde ou como o ovo é botado, não importa
se está fertilizado ou não, cada ovo é o começo de uma galinha. E cada minuto que
eu observei aquela grande galinha preta procurando e chamando, horas depois de
seu ninho ter sido roubado, eu soube que não importa a definição que a gente dê
para o seu relacionamento com seus ovos, eles não nos pertencem.
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Esse texto foi o que me fez compreender a problemática dos ovos numa abordagem vegana. Antes disso eu não conseguia entender porque seria errado comer ovos não galados. Esse texto me tocou muito profundamente. Eu espero que possa ajudar outras pessoas também. Me senti extremamente feliz de poder traduzir e publicar essas palavras. Ainda trago todos os links depois, que a urgência é maior que o meu tempo disponível no momento. O link está disponível no título, mas segue aqui também.
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