quarta-feira, 4 de novembro de 2015

A relação de uma galinha com os seus ovos




Por ALISA RUTHERFORD-FORTUNATI em 29 de junho de 2012


Galinhas, como todos os animais, possuem uma linguagem única para comunicar-se com os de sua espécie. Cada sequência de sons que elas piam, cacarejam e cantam tem um significado social, emocional ou pessoal. E se você passar tempo suficiente com esses amigos emplumados, você começaráa escutar as histórias que elas estão contando, assim como aconteceu comigo.


O canto trompeteador do galo convocando suas galinhas para o jantar.


As piadas rápidas dos pintinhos enquanto procuram por sua mãe.


O cacarejo oscilante de uma galinha enquanto ela bota um ovo…


De todos os sons que eu conheci durante o ano que passei voluntariando em fazendas orgânicas, eu acredito que a canção de botar ovos das galinhas foi o que mais me impactou. De alguma forma eu acreditava que era um processo silencioso, que as galinhas iam sorrateiramente para o seu esconderijo favorito e calmamente construiam  seu ninho.


Enquanto as galinhas realmente buscam a solidão à medida que o processo de postura de ovos se inicia, elas também começam a emitir um padrão inconfundível de cacarejos acentuado por um notavelmente alto “Cóooo!”ao final de cada frase. Elas cantam esta canção com tanta intensidade, olhos arregalados e agitados, até que o ovo seja finalmente empurrado para fora. É o suficiente para fazer qualquer um se sentir agradecido por não ter nascido uma galinha poedeira. 


Embora nossas galinhas poedeiras de hoje sejam as descendentes do Galo Banquiva (Gallus gallus) que bota cerca de 60 pequenos ovos por ano, a maior parte das nossas galinhas domesticadas modernas foram criadas para botar mais de 300 ovos grandes por ano.


Se deixadas livres para se comportar de maneira “natural”, a maior parte das galinhas vão botar o numero de ovos que desejem para uma ninhada apropriada e então param de produzir mais ovos até que seus filhotes estejam crescidos o suficiente para alimentarem-se sozinhos. 


O período antes da eclosão de seus ovos, enquanto ela se senta em seu ninho, esquentando e protegendo seus ovos, é chamado de “período de choca”.


Se os ovos de uma galinha são retirados em uma frequência regular, ela continua a botar, em uma tentativa inútil de seguir seus instintos e formar uma ninhada apropriada. Na verdade, os instintos de aninhamento das galinhas são tão fortes que elas continuam a tentar montar uma ninhada tendo ou não um galo presente para fertilizar os seus ovos*.


*Acredita-se que as galinhas não tem como saber quais de seus ovos foram fertilizados com sucesso.


Nesse ponto minha empatia por estas pequenas fêmeas emplumadas deve estar evidente, mas infelizmente não esteve sempre tão presente. Durante o tempo que trabalhei com elas, houve um

 bocado de experiências que mudaram minha perspectiva sobre ovos e abriram meu coração para as galinhas que os haviam botado.  


  A primeira começou fazendo uma omelete caseira de “ovos frescos de fazenda” de ovos que uma amiga havia coletado. Eu quebrei dois ovos sem nenhum problema. Mas no terceiro, ao invés de gemas e claras, um corpo pequeno e parcialmente formado de pintinho escorreu para a frigideira. Meu estômago subiu por minha garganta. De alguma forma ver o início de um corpo em um dos ovos que eu estava prestes a ingerir pareceu muito diferente para mim do que simplesmente ingerir um óvulo não fertilizado. De repente ovos não eram mais algo que você simplesmente escolhe no Mercado. Ao invés disso, eu comecei a enxerga-los como o começo de uma galinha.


A segunda experiencia que mudou minha perspectiva foi o dia que eu me vi retirando ovos diretamente debaixo de uma galinha chocando. Nesta manhã em particular eu estava ajudando a podar lavanda em uma fazenda que eu estava voluntariando. Meu anfitrião e eu estavamos cortando as lavandas quando de repente escutamos um cacarejo agitado abaixo de nós. Conforme empurramos um dos arbustos nós encontramos uma galinha preta grande que tinha feito um ninho. Ela estava tentando proteger sua ninhada dos intrusos que pairavam sobre ela, mas ela não era capaz disso. Ela havia sido trazida para a fazenda para produzir ovos, e ainda que ela tivesse sido astuta o suficiente para construir um ninho longe do galinheiro, seus ovos não eram considerados como propriedade dela.


Como nós conseguimos tirar ela do ninho está um pouco nebuloso na minha memória, mas eu acredito que  a distraí enquanto meu companheiro no crime rapidamente a apanhou. E então eu tomei os ovos de debaixo dela.



Eu rapidamente coloquei os ovos na geladeira para que os funcionários da fazenda levassem para casa, já que pensamos que ela não havia chocado por tempo suficiente para que os pintinhos se formassem.

Quando fui para fora de novo, eu encontrei a galinha preta frenéticamente ziguezagueando para dentro e para fora da lavanda, chamando por suas amigas galinhas, algumas das quais correram para acudir enquanto ela continuava procurando por seus ovos desaparecidos. Eu tentei colocar minha culpa de lado e continuar com meu dia. Mas quando retornamos para almoçar, horas mais tarde, ela ainda estava lá se movendo vagarosamente para dentro e para fora da plantação de lavandas e balbuciando consigo mesma enquanto procurava em vão.

Eu falei de minha culpa para o meu anfitrião e nós debatemos sobre se nós deveríamos devolver os seus ovos. Até que finalmente acordamos que era tarde demais, os ovos haviam sido resfriados por muito tempo e nós deveríamos deixar estar.

De alguma forma, cada ovo botado drenou seu corpo de cálcio e outros nutrientes essenciais*, desnecessariamente encurtando sua vida para alimentar os seus captores. E agora, não importa o quanto seus pequenos olhos tristes procurem, todo o seu trabalho foi perdido.



*Algumas galinhas (se elas não tiveram seus bicos decepados) irão comer seus próprios ovos não fertilizados se o ovo estiver quebrado, se elas estiverem sob estresse, para repor nutrientes perdidos pela bota de ovos (se elas estiverem com falta de nutrientes), ou se não houver espaço suficiente no ninho.

O que é um ovo para uma galinha?



Cada galinha, assim como com as pessoas, é diferente. Algumas são distraídas, chocando no meio do

quintal. Outras são agressivas e reservadas, tentando bicar os calcanhares de qualquer um que passe por perto. E outras ainda, como a mamãe galinha da lavanda, que criam laços com cada ovo que botam.

Não importa a personalidade, não importa onde ou como o ovo é botado, não importa se está fertilizado ou não, cada ovo é o começo de uma galinha. E cada minuto que eu observei aquela grande galinha preta procurando e chamando, horas depois de seu ninho ter sido roubado, eu soube que não importa a definição que a gente dê para o seu relacionamento com seus ovos, eles não nos pertencem.

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Esse texto foi o que me fez compreender a problemática dos ovos numa abordagem vegana. Antes disso eu não conseguia entender porque seria errado comer ovos não galados. Esse texto me tocou muito profundamente. Eu espero que possa ajudar outras pessoas também. Me senti extremamente feliz de poder traduzir e publicar essas palavras. Ainda trago todos os links depois, que a urgência é maior que o meu tempo disponível no momento. O link está disponível no título, mas segue aqui também.

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